Monday, September 18, 2006

Necrofilia


Necrofilia

No espaço de inacreditável sintonia, encontrei-me extasiada. Perplexa nas suas relações interpessoais, pude ingressar em suas construções de pensamentos, e meio aos meus tormentos, apercebi-me em uma, fisiologicamente explicável, necessidade de urinar.
Os objetos desconhecidos rondavam minha percepção e, vagarosamente, ía fazendo-me parte daquele universo de sensações.
Tentei conter os complexos, as mágoas, mas não pude evitar a vontade que progredia cautelosamente neste tão frágil mas complexo corpo.
Em direção ao tão conhecido sanitário, rumei quase sem sentidos, devido ao alto nível ópico em que me encontrava.
Quando finalmente pude encontrar a almejada porta, que se abria como um parque de diversões diante de meu agonizado corpo, mal pude evitar o gozo que percorria meus sentidos como uma corrente de violentas águas prestes a rebentar a represa que as contêm.
Sentei-me e o líquido sem sutilezas foi por mim despejado, em buraco neste momento, acolhedor, eliminando as impurezas há tão pouco acumuladas em meus rins.
A urina descia como um rio sorridente navegando os limites da privada, e naquele momento filosofal, de observação pelas paredes desconhecidas, vi a cortina de florzinhas, sedutoramente, escondendo a banheira onde as pessoas que habitavam aquele coito lúdico banhavam-se.
Uma impetuosa vontade de desvendar o mistério que aquele plástico guardava invadiu meus sentidos e, em um súbito movimento, a abri.
Penso, quando algo é aberto, inúmeras possibilidades envolvem nossos pensamentos, determinando verossímeis ou inadmissíveis visões e sensações. Mas, desta vez, o extraordinário fez-se presente e, ainda hoje, pergunto-me se não foi delírio alcoólico ou sensação palpável.
Aquele muro aprisionava um ser, que senão morto, parecidamente desprovido de vida, sua pele e lábios roxos, sua fisionomia era de um defunto. Este me olhava fixamente, determinando com seu olhar suas mais obscuras intensões.
Sem acreditar no que lia em seus olhos, agi impetuosamente, molhando seus lábios com meu desejo. Lambi vorazmente sua suculenta boca, de tal forma o fiz, que se vivo o ser fosse teria eu sentido o salgado de seu sangue em minha língua. Chorei em orgasmos múltiplos, entregando-me profundamente aos seus imprudentes e mórbidos desejos.
Transei com um defunto, sim, trepei no morto. Engoli suas partes frias, e voluptuosamente senti seu membro roçar minhas coxas e invadir minhas entranhas prazerosamente. Finalmente, e como jamais poderei sentir novamente gozei o gozo que transcende todas as percepções possíveis.
Seu corpo que parecia fortificar meus complexos sentimentos fazia-se frio dentro de mim.
Ao refletir o ato consumado, entendo que o prazer perpassa esta carne tão exposta aos olhos, que seduz e abrasa pensamentos. O gozo que não se limita toca-nos a alma, liberta-nos além do que se possa declarar.
Meu corpo imbuído de fluidos busca tua carne como instrumento para atingir teu espírito. Todavia, longe de minha vontade seria profanar o corpo de mortos, já que não invadirei cemitérios em busca de carnes pútrefas. Até porque, neste viver contido, corpos frios perambulam pelas avenidas, expondo seus mais sórdidos desejos, refletidos em toques intensos de pura diversão. Meu corpo é todo instrumento do gozar, e que depois os vermes me comam a carne, mas só depois de haver sido de toda a utilidade que me aprouver.

1 Comments:

Blogger O pajé da tribo dizimada said...

Ah, acabei mandando por e-mail o comentário. Mas vai que tu não receba de novo né... Adorei esse conto, na verdade gostei do blog todo, porém esse conto me chamou muito a atenção. Gostei muito da parte em que tu diz: " se vivo o ser fosse sentiria o salgado de seu sangue em minha língua ". Eu te falei que tinha mandado e-mails para o yahoo, na verdade eu só tenho teu e-mail do hotmail. um beijo!!! Visita o meu blog também, é andredasletras.blogspot.com

12:48 PM  

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